O Brasil carrega consigo um histórico inegável e doloroso de escravidão. Com africanos sendo arrancados de suas terras e trazidos para o país como principal motor de uma economia agrícola robusta, sua marca é profundamente enraizada.
Não é exagero afirmar que “sim, a escravidão ajuda a explicar o Brasil”. Contudo, a atenção é frequentemente desviada de um aspecto fundamental: aqueles que se beneficiaram da posse de escravos.
Os vestígios dessa mentalidade ainda ressoam hoje, especialmente quando observamos situações trabalhistas degradantes e a falta de reconhecimento de direitos básicos, como os direitos dos empregados domésticos. A reação à PEC das Domésticas em 2013 é um exemplo notável dessa realidade.
Finanças e Suas Raízes na Escravidão
A relação entre escravidão e economia não termina com a mão de obra. Existe um aspecto profundo e frequentemente negligenciado: a íntima ligação entre a escravidão e a fundação do sistema financeiro brasileiro.
Uma investigação recente lançada pelo Ministério Público Federal revelou que o Banco do Brasil pode ter raízes profundas no comércio de escravos.
A chegada de D. João ao Rio em 1808 foi patrocinada e incentivada por uma elite rica, cuja riqueza vinha do tráfico de escravos. Esse dinheiro, fruto da exploração, foi instrumental na criação do Banco do Brasil.
Banco do Brasil: Controvérsias e Conexões Ocultas
Apesar de o tráfico de escravos ser legal em 1808, a narrativa se complica quando consideramos o ressurgimento do Banco do Brasil em 1853, após sua falência em 1829.
Em meio a um período de tráfico de escravos ilegal, o banco foi reconstruído. A proibição oficial do tráfico de escravos veio em 1831, mas as práticas ilícitas persistiram.
De 1835 a 1850, centenas de milhares de africanos foram ilegalmente trazidos ao Brasil. O capital dessas atividades clandestinas tornou-se a espinha dorsal do rejuvenescido sistema financeiro brasileiro, um verdadeiro esquema de blanqueamento de capitais.
A Elite Financeira e Suas Transações Sombrias
Um documento revelador, apoiado por diversos historiadores, mostra que os pilares da elite financeira do país eram profundamente envolvidos com o tráfico de escravos.
José Bernardino de Sá é um exemplo. Sendo um dos principais acionistas do Banco do Brasil, ele também era notoriamente envolvido no tráfico de escravos.
Essa não era uma ocorrência isolada. Muitos daqueles no topo da hierarquia do banco não apenas possuíam escravos em grande número, mas também estavam envolvidos em práticas ilegais.
Grande parte da riqueza gerada no Brasil durante o século XIX, que formou a base do sistema financeiro, estava intrinsecamente ligada ao tráfico ilícito de seres humanos.
Reconhecimento e Responsabilidade Histórica
É imperativo não apenas reconhecer o tráfico transatlântico como um crime contra a humanidade, mas também tomar medidas proativas para abordar suas consequências duradouras.
A iniciativa do Ministério Público sobre o Banco do Brasil é uma etapa vital nesse processo. Apenas ao responsabilizar aqueles envolvidos e reconhecer o legado de nossa história podemos começar a reparar os danos e buscar uma verdadeira reconciliação.